Estamos casados há onze anos. Conhecemo-nos no meu local de trabalho. Ele estudava na escola onde estou a leccionar mas era apenas um no meio de todos os outros. Não era meu aluno, era aluno da escola e, posteriormente, foi meu explicando. Acompanhei o crescimento dele a nível de estudos, como explicadora, e reparei realmente que ele era extremamente maduro para a idade que tinha, relacionava-se com pessoas com muito mais idade do que ele.

Na altura, era casada e tinha duas filhas. Era um casamento de vinte anos que já estava completamente desmoronado. O meu ex-marido era uma pessoa extremamente egoísta e muito exigente. O Gabriel e um outro explicando, que tinha na altura, chegaram mesmo a assistir, por diversas vezes, a cenas de conflito e agressão, situações que para mim, no dia-a-dia, infelizmente, eram vulgares da parte do meu ex-marido.

Ele não tinha qualquer tipo de problema em agir assim mesmo com pessoas presentes. Foi a partir daí, depois de o Gabriel assistir a determinado tipo de situações em relação a mim e também às minhas filhas que se criou uma certa amizade...

Tempos difíceis

O Gabriel sempre teve muita consideração por mim e questionava muitas vezes como eu aceitava aquilo. Mas nada pressupunha que aquela amizade viria dar em casamento. Até porque eu, ao princípio, pensava que ele era admirador da minha filha mais velha, que tem quase a idade dele. Ele era muito amigo das minhas filhas, era realmente aquele companheiro, o irmão mais velho que elas não tinham, que as sabia ouvir, escutar. Era uma pessoa muito amiga.

O momento de viragem surgiu quando comecei a tratar do divórcio. Saí de casa, peguei nas minhas filhas e fui viver para uma casa alugada. Nessa altura, os meus pais, que moram noutra cidade, vieram para junto de mim. Foi uma fase complicada. O divórcio foi litigioso, houve muitos problemas e ele e os outros dois amigos, meus
ex-explicandos, foram até testemunhas no processo.

Durante esse período, a amizade continuou. Nessa altura, já não o tinha como explicando, mas tanto ele como outros dois amigos mais velhos continuavam a ir lá a casa, falavam com as miúdas, saíam. As «miúdas», era assim que eles se referiam às minhas filhas embora tivessem quase a mesma idade.

Amizade especial

Um ano depois, o processo terminou e foi aí que as coisas se desenrolaram. Uma vez, saí das aulas à noite e, quando cheguei a casa, ele estava lá, a falar com os meus pais. Estavam todos a rir. Fiquei desconfiada. Havia ali qualquer coisa que não me queriam contar. Foi então que ele disse que tínhamos um assunto muito sério para tratar. Entrei em pânico.

Pensei logo que tinha havido algum problema com as minhas filhas. Elas apressaram-se a dizer que não, entre risinhos. Ele disse que já tinha falado com os meus pais e com a minha filha mais velha e o que se passava realmente era que gostava de mim. Quando disse «eu gosto de ti», fiquei boquiaberta.


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Tentei minimizar o que se passava mas ele insistiu. «Eu gosto mesmo de ti e quero assumir uma relação contigo», recorda. Fiquei sem palavras.
Todos já tinham percebido menos eu.

O meu pai ria-se, a minha mãe olhava para mim e sorria e eu pensava na figura de parva que estava a fazer. Se um dia me dissessem que, após um casamento de vinte anos, me divorciava e casaria com um rapaz vinte anos mais novo, pensaria que deviam estar todos malucos.

Da paixão à união

Não estava apaixonada, nem pouco mais ou menos, até porque considerava já não ter idade para essas coisas (o que posteriormente verifiquei que era mentira, claro). Mas vi que era qualquer coisa de muito especial. Ele tinha dezoito anos e eu trinta e oito quando iniciámos a relação.

A certa altura, alertei-o para que não esperasse que eu andasse pela cidade de mão dada, por exemplo, ao que me respondeu com uma afirmação avassaladora. «Não quero andar de mão dada contigo, nem te quero para minha amante. Quero-te para minha mulher!», recorda. Senti um baque. Faltou-me o pé, faltou-me a visão. Fiquei estarrecida.

Um ano depois casámos. A cerimónia decorreu num restaurante com vista para a cidade e foi algo muito belo. A notária deslocou-se lá para fazer o registo e o meu pai e a minha filha mais velha foram os meus padrinhos de casamento. Escolhi o meu pai porque é o meu ídolo e a minha filha porque foi minha filha, minha amiga, a irmã que não tive e a quem me agarrei para ultrapassar muitos dos meus obstáculos ao longo da vida.

Havia pessoas que pensavam que era um casamento destinado ao fracasso. «Não dou mais do que um ano» foi um dos comentários negativos que ouvi. Mas as coisas não são assim. Só acaba quando eu quiser e ele quiser. Não é pelos outros quererem que vai terminar. Nós não deixamos que as pessoas acabem com aquilo que estamos a construir.

Corrida de obstáculos

O início não foi fácil. Tinha uma posição a defender e foi um bocado complicado. Quer dizer, foi e não foi, porque houve pessoas que não entenderam, enquanto que outras me felicitaram. Havia sempre comentários, até quando passava na rua. Por vezes, ouvia um comentário ou outro do género «Então, mas esta ainda cá está? Não se vai embora?». E cheguei mesmo a responder: «esta tem nome. Vão continuar a conhecer-me como sempre me conheceram. Não fujo.»

As pessoas estavam à espera que me fosse embora, que não enfrentasse isto. Vivo numa cidade pequena e, além disso, o meu ex-marido era uma pessoa extremamente conhecida. Estavam todos a contar que eu fosse recomeçar a vida noutro sítio. Mas sou uma pessoa que vai à luta. Por isso, encarei toda a sociedade e tudo aquilo que me rodeava.

O meu primeiro receio era principalmente em relação às minhas filhas. Não era às pessoas ou ao meu posto de trabalho porque que passo por cima disso tudo, ou tento mostrar uma carapaça que às vezes não tenho. Tendo o apoio das minhas filhas, dos meus pais nada mais me faria voltar atrás. Além disso, muitos amigos meus, de longa data, sempre me apoiaram e têm-me acompanhado. Nos momentos em que os procuro eles estão lá. Conto com eles.

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Vida nova

Voltei a fazer parte do orfeão, que é uma das coisas que sempre gostei de fazer, pois já no meu tempo universitário cantava e fazia parte das tunas. Houve coisas que ele me fez reviver, como a minha juventude que não tinha vivido porque casei muito nova.

Por outro lado, tenho-lhe dado uma certa maturidade. Há uma espécie de intercâmbio.

Apesar de ele ser uma pessoa extremamente adulta (que sempre foi) e muito responsável não se pode esquecer que há uma idade diferente e temos atitudes e comportamentos próprios da nossa faixa etária, mas conseguimos sempre contrabalançar. Além disso, não me identifico muito com as pessoas da minha idade, na maneira de pensar ou de agir.

A nossa diferença de idade incentivou, sem dúvida, o diálogo. Se há algo que nos magoa ou corre menos bem falamos. É uma relação estável, de respeito, com altos e baixos como todas as outras mas em que não se transporta para a intimidade qualquer tipo de problema. É muito aberta, franca. O Gabriel tem estado sempre ao meu lado tem-me apoiado em tudo.

Quando casámos pensámos em ter um filho. Fomos ao médico ver se estava tudo bem e ele aconselhou-nos a tentar. O tempo passou e a hipótese não surgiu, mas neste momento acho que não há qualquer problema por causa disso. Sou directa e realista. Tudo é bom enquanto dura. Vivo o momento presente, o dia-a-dia, não perspectivo o futuro...

Final feliz

Desde o início, os meus pais e as minhas filhas, agora com trinta e vinte e cinco anos, aceitaram perfeitamente a minha relação. Em família, o convívio é bom e entendem-se todos muito bem. A minha filha mais velha está casada e serei avó em breve. Ao Gabriel, a minha neta chamará pelo nome. Ele vai ser um companheiro e um amigo.

Na escola nada mudou. Tenho um bom relacionamento com os meus alunos, dou um murro na mesa se for preciso e um sorriso quando é necessário. Actualmente, até já tenho alunos que são filhos de ex-alunos. Há uma afinidade muito grande. São trinta anos de ensino que trago dentro de mim.

Agora, se voltasse atrás, faria exactamente o mesmo. Tenho feito outras coisas que antigamente não fazia, uma vida muito mais independente, se quero ir visitar os meus pais, a minha filha ele incentiva-me. É diferente. Sinto a liberdade de uma idade que não vivi e que tenho estado a viver ao longo destes onze anos. Tenho sido eu mesma.